sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Um debate sobre Jazz(bem)afinado

Na tarde de domingo, 12 de dezembro, o jornalista Roberto Muggiati (com o microfone em mãos) e o compositor Bernardo Vilhena conversaram com a plateia sobre jazz. Histórias, temas, personagens, dúvidas, o que é e o que gostaria de ser jazz foram alguns dos assuntos em pauta.

Em seguida, foi a fez do sexteto Jazzafinado encerrar a série, apontando para o futuro do jazz brasileiro. No roteiro, faixas do álbum 'Segundo round', que é um primor (as autorais "Desfunkcionalidade", "Solicitude" e "Com o senhor tem festa", além de algumas inéditas), e clássicos da música instrumental. Veja as imagens da apresentação:




Por Monica Ramalho
Fotos de Paula Monte

O bandolim que vale por uma orquestra

"A pergunta da série vai de encontro à música que eu faço. Há muito tempo busco esse caminho. Isso é jazz ou não é? Respondendo: isso não é jazz, é música brasileira", assim o bandolinista Hamilton de Holanda, a grande estrela do festival, abriu seu concerto solo, tocando a autoral "Negro samba". Em seguida, ouvimos, extasiados, "Vou vivendo", de Pixinguinha, "7 anéis", de Egberto Gismonti, e "O que será?", de Chico Buarque. Sem nenhuma combinação prévia, os filhos do bandolinista se aboletaram no palco para assistir ao pai bem de perto.

Gosto muito desse Hamilton mais tranquilo, interpretando sozinho composições que o acompanham a vida inteira. Ele faz com que velhas canções soem inéditas na versão instrumental com o seu jeito de ler as músicas. Dos afro-sambas de Baden Powell e Vinicius de Moraes, ele escolheu "Canto de Iemanjá". Emendou com "Pro Anjos", de própria autoria, inspirada na obra do uruguaio Agustín Barrios e dedicada aos arquitetos Oscar Niemeyer e Lúcio Costa.

Sereno e bem humorado, ele arrancou boas risadas da plateia ao contar que os bandolinistas passam metade do tempo afinando o instrumento e a outra metade, tocando desafinado (risos). Interpretou o clássico "Beatriz", de Chico Buarque e Edu Lobo, com todo o sentimento do mundo. Quem fechou os olhos ouviu uma pequena orquestra de cordas no palco. Esse show comemora os dez anos do bandolim de dez cordas inventado pelo Hamilton.

Inspirado em Astor Piazzolla, bandoneonista e compositor argentino, Hamilton escreveu "Estações", um desses temas que trazem um certo grau de complexidade mas, ao mesmo tempo, têm a virtude de chegar simples nos ouvidos. A valsa "Flor da vida", que ele fez para a mulher, foi a próxima música a deixar o público boquiaberto.

Para fechar, mais um afro-samba de Baden e Vinicius, "Canto de Ossanha", antes de um, dois, três bis. Meus amigos que foram prestigiar o show agradeceram pela noite, de fato, gloriosa. Até a próxima edição, Hamilton de Holanda. Quero você e o pianista André Mehmari no programa do segundo Isso é Jazz?

Por Monica Ramalho
Fotos de Paula Monte

terça-feira, 28 de dezembro de 2010

Victor Biglione em casa

Muitíssimo bem acompanhado por Alex Rocha no baixo acústico e Victor Bertrami na bateria, o guitarrista Victor Biglione fez, na noite do 10 de dezembro, o show mais espontâneo da série ISSO É JAZZ?, promovida, na boca miúda, ao status de festival. Talvez um mini-festival, que começa a crescer nos rabiscos que já estamos fazendo por aqui. Sim, aguarde uma próxima edição!

Apaixonado pela namorada nordestina, com quem vai se casar em 14 de janeiro, o guitarrista abriu a noite com uma versão entusiasmada de "Mulher rendeira". Em seguida, emendou clássicos de Miles Davis, João Donato, Marcos Valle, Tom Jobim, Johnny Alf, Dizzie Gislepie e muitos outros. O roteiro foi completamente esquecido, o que tornou tudo ainda mais mágico. O show foi se desenhando de acordo com a resposta do público!

Ninguém segurou a agilidade do rapaz, que costurava os temas, alternava os andamentos, derramava um pouco o coração em comentários espirituosos e perspicazes e, de quebra, ainda arrebatava a plateia, que estava concentrada. Plateia que, a certa altura, pediu um tango do músico nascido na Argentina, embora criado no Brasil. Ponto alto no quesito emoção,"Por una cabeza", sucesso de Carlos Gardel, foi uma das últimas e mais aplaudidas peças da noite. Obrigada pelo showzaço, Vic!

Por Monica Ramalho
Foto de Camila Marchon

sábado, 11 de dezembro de 2010

Uma aula de UFRJazz

À frente de 18 intérpretes extraordinários, o maestro e clarinetista José Rua rebobinou a história do jazz nas big bands e ilustrou o que nos contava musicalmente, desde os seminais spirituals americanos ("When the Saints go marching in", com arranjo de Dean Sorenson) até o repertório contemporâneo, em temas como "High maintenance", de Gordon Goodwin, e "Brooklin high", do brasileiro Nelson Faria.

"Jazz não é apenas uma palavra, é um som", disse Rua, enquanto recordava histórias como a de Glenn Miller, que sempre usava o trompete para os solos até que um dia o trompetista da sua orquestra faltou ao ensaio e ele improvisou, pedindo para o clarinetista fazer a parte do colega. "Foi assim que Glenn Miller descobriu o som que ele queria para a sua orquestra", sentenciou José Rua, antes de embocar ele mesmo a clarineta e tocar a célebre "Moonlight serenade", parceria de Miller com Mitchel Parish.

Outros temas importantes como "April in Paris" (escrito por Vernon Duke, com arranjo de Bob Mintzer) e "Corner Pocket" (Freedie Green, arranjo de Ernir Wilkins) foram destrinchados pelos músicos da UFRJazz Ensemble na segunda noite da série. "Figura lendária, Count Basie usava poucas notas, mas usava muito bem. Era considerado o malandro do jazz. Count interpretava como ninguém esse clássico 'April in Paris'", contou Rua.

O público se animou já nos primeiros acordes dos temas de filmes, como "The Pink Panther" (de Henry Mancini, arranjo de Dave Wolpe) e "Mission impossible" (de Lalo Schifrin, interpretado nessa noite com arranjo de Roger Holmes). E José Rua aproveitou para lembrar como as big bands estão no imaginário da gente, através das trilhas de desenhos da Disney e dos clássicos do cinema. A UFRJazz apresentou um showzaço na segunda - e estrondosa - noite da série ISSO É JAZZ?, que vai até domingo na Caixa Cultural, com ingressos a R$ 10.

Por Monica Ramalho
Fotos Paula Monte

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Estreia quente para uma casa lotada

A música do Aquarela Carioca é bem viva. A dobradinha de Lui Coimbra (violoncelo) e Marcos Suzano (percussão) emocionou a plateia na primeira noite do ISSO É JAZZ?

Senhor dos sopros, Mário Sève fez solos arrebatadores em músicas como "Canto do cisne negro", de Heitor Villa-Lobos e "Saci", de Guinga e Paulinho Pinheiro

Paulo Muylaert (ao fundo, na guitarra) e Paulo Brandão (baixo) seguraram a base para o trio violoncelo, sax-flauta e percussão

O Aquarela Carioca garantiu um showzaço, com roteiro variado, que incluiu uma adaptação de um mantra indicano e "Kashmir", clássico do Led Zeppelin

Por Monica Ramalho
Fotos Paula Monte

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

O choro influencia o jazz, que influencia o choro

Dizem que ele já nasceu americanizado e no início do século XX já podia ser ouvido, tocado e admirado em Nova Orleans. O improviso teria chegado por aqui um pouco depois influenciando os primeiros grupos de choro e transformando o tal jazz em uma outra coisa, totalmente brasileira.

"Se você precisa perguntar o que é jazz, então você nunca vai saber", dizia Louis "Satchmo" Armstrong. Durante cinco dias nós vamos reformular a questão para saber se o que fazemos por aqui, está ou não dentro do verbete. ISSO É JAZZ? levanta o debate e pede passagem convidando alguns dos mais importantes instrumentistas brasileiros. A resposta é toda sua.

Leia, a seguir, dois dedos de prosa com o Aquarela Carioca, escolhido para abrir a série essa noite:

ISSO É JAZZ - Na estrada há mais de 20 anos, o quinteto vem executando um pouco de tudo, entre clássicos e composições próprias. Quais são as principais referências do grupo?
AQUARELA CARIOCA - O Aquarela, com Marcos Suzano, Lui Coimbra, Paulo Muylaert, Paulo Brandão e Mário Sève, tem uma formação inusitada, na qual o cello convive bem com a guitarra distorcida e o baixo elétrico, assim como o pandeiro plugado com o saxofone. Foi criado por cinco músicos (urbanos) cariocas que sempre ouviram de tudo, desde clássicos da MPB, do rock, do samba, do pop, do afro até o jazz americano. Navegamos em muitas praias, fizemos um CD com o Ney Matogrosso, viajamos o mundo com ele. É natural que na mistura do grupo tenha um pouco de tudo, dessas referências.

ISSO - Vocês acreditam que existe uma forma de jazz essencialmente brasileiro? Qual é o peso da "tradição instrumental brasileira" na personalidade do Aquarela Carioca?
AQUARELA - Acreditamos que existe na música brasileira uma característica maravilhosa: a de tudo ouvir e recriar. Gostamos de harmonia, de liberdade, de ritmo, de criar melodias. Obviamente, da sua maneira, o jazz tem isso. Para nós, nossa tradicional "música dos músicos" está no choro, suas raízes e derivados... Nazareth, Pixinguinha, Radamés, Villa, Egberto e Hermeto. Impossível um grupo instrumental soar brasileiro sem essa base. Mas acho também legal a música do Aquarela estar desprovida de rótulos e contextualizações; com caráter, ufa..., "não-temático".

ISSO - O que vocês prepararam para a apresentação que abre o Isso é jazz?
AQUARELA - Mostraremos uma coletânea de obras de nossos CDs, inclusive do recém lançado e pouco tocado "Mundo da Rua". No geral, o roteiro do show é formado por temas que o público do Aquarela vai, certamente, adorar (re)ouvir, já que há um ano não nos apresentamos no Rio. Teremos Led Zeppelin, Caetano, Guinga, Piazzolla, Villa Lobos, Korsakov, Abdulah Ibrahin e autorais.

Por Marcelo Pacheco
Foto divulgação

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

ISSO É JAZZ? rola entre 8 e 12.12, na CAIXA

Estimular o ouvido e o pensamento para o jazz que nasce no couro de um pandeiro, nas cordas de uma guitarra e nas chaves de um saxofone bem brasileiros. Foi para isso que pensamos na série ISSO É JAZZ?. Queremos investigar de que maneira os músicos do país do samba, do choro e da bossa nova processam as heranças do jazz mundial e combinam seus elementos com o nosso instrumental, que é rico harmônica e melodicamente e conta com representantes de talento inquestionável como essas atrações que reunimos aqui. Escrevo esse release em primeira pessoa porque também assino a curadoria da série.

Produzida pela Baluarte Agência, a série será formada por cinco shows e um debate, realizados na CAIXA Cultural, entre os dias 8 e 12 de dezembro de 2010, às 19h. Nos roteiros, muitos temas autorais e reinvenções de clássicos. Em cada noite, uma formação: big band, sexteto, quinteto, trio e até um espetáculo solo. Para o debate, convocamos dois especialistas, seguindo a lição do pensador Marshall McLuhan, para quem “a palavra jazz vem do francês ‘jaser’, conversar. E o jazz é, na verdade, uma forma de diálogo entre instrumentistas”.

A estreia será com o Aquarela Carioca, que traz a maturidade de vinte anos na estrada revestida de uma embalagem bem contemporânea. A banda é formada por músicos experientes que ousam experimentar, seja ao lado de outros criadores ou, ainda, em admiráveis voos solo. São eles: Lui Coimbra (violoncelo, rabeca e voz), Mário Sève (saxofones, flautas e pífanos), Marcos Suzano (percussão, bateria e programações), Paulo Muylaert (guitarras, violão, viola, acordeão e programações) e Paulo Brandão (baixo, baixo com e-bow, sonoplastias, voz e programações).

Na quinta, dia 9, a UFRJazz Ensemble vem reforçar a série com a impetuosidade de seus arranjos atuais. É uma importante big band universitária, talvez a mais profissional do país. Foi criada pelo maestro José Rua durante a Oficina de Prática Instrumental da UFRJ há quase 15 anos e está na terceira geração de músicos da orquestra, por onde passou o célebre trombonista Raul de Souza, radicado nos Estados Unidos. Incluímos uma big band para reverenciar as formações que fizeram sucesso lá fora entre os anos 20 e 50 e, no Brasil, na década de 60 através das populares gafieiras.

Na sexta, dia 10, vamos escutar a guitarra incandescente do argentino Victor Biglione, premiado compositor de trilhas para cinema. É também o mais roqueiro das atrações do ‘Isso é Jazz?’ e essa característica nos será muito útil porque ele vai fazer a ponte entre os dois gêneros americanos. Victor lançou recentemente dois álbuns emblemáticos e na linha que pretendemos investigar: ‘Uma guitarra no Tom’, no qual relê os clássicos de Tom Jobim, gênio da bossa nova, outra música que influenciou e foi influenciada pelo jazz, e ‘Tributo a Ella Fitzgerald’, com a cantora Jane Duboc.

No sábado, dia 11, será a vez de comemorar os dez anos do bandolim de dez cordas, inventado por Hamilton de Holanda. O carioca educado em Brasília, que ultrapassou como poucos de seus pares as barreiras estilísticas do instrumento, vai fazer uma apresentação solo, a mesma que vem amealhando plateias e resenhas favoráveis na mídia internacional. Não é por menos. Hamilton é mais requisitado como solista do que acompanhador porque seu bandolim traz o desejado som da surpresa.

Para fechar, no domingo, dia 12, às 17h30, haverá um debate entre o compositor Bernardo Vilhena e o jornalista Roberto Muggiati, amigos de longa data. Vilhena é idealizador e curador do CopaFest, que avança para sua quarta edição e é todo dedicado à música instrumental, e Muggiati costuma dar cursos sobre a temática em escolas conceituadas e é autor de livros sobre jazz. Será um prato cheio para quem gosta de um papo inteligente, conduzido por quem realmente estuda e produz música.

Em seguida, às 19h, teremos o suingue do Jazzafinado, um sexteto de jazz formado por jovens cariocas. Eles tocam em bares há mais de uma década e lançaram dois discos fabulosos, com repertório próprio e dançante. Além do valor musical, claro, a banda enxerta no ISSO É JAZZ? aquela malandragem que vem das ruas, já que costuma tocar em quiosques ao ar livre. O Jazzafinado reúne Bernardo Bezerra (piano elétrico, teclados e gaita), Júlio Merlino (flauta soprano e saxofone alto), Rafael Garaffa (baixo), Rodrigo Borges (guitarra), Rodrigo Scofield (bateria) e Thiago Ferté (saxofone tenor).

A CAIXA Cultural RJ fica na Avenida Almirante Barroso, 25, Centro do Rio. Informações: (21) 2544.4080. Ingressos a R$ 10 (inteira); estudantes, maiores de 60 anos e funcionários da CAIXA pagam R$ 5 (meia entrada). Classificação livre; 189 lugares; acesso para portadores de necessidades especiais.